domingo, outubro 30, 2005

since Outubro 30

“O pano já subiu. Agora sou só eu e o público. Eu e vocês. Neste teatro das palavras.”

há um ano o teatro abria assim. hoje, sem mais, assim há-de continuar. o que aqui se disse, o que aqui se escreveu é já memória, arquivo morto. a crítica há-de dizer-se ou escrever-se um dia. por agora, assumem-se os erros, limpam-se os fatos, aprumam-se os adereços, relembram-se as deixas e, como há um ano atrás, sonha-se.

a festa faz-se, de novo, logo à noite, quando, uma vez mais, se voltarem a abrir as cortinas. quando, por entre os rompimentos, gente, de corpo e alma, se entrega, de novo, ao momento e à magia do palco. construindo infinitos sonhos em pequenos espaços de tábuas, entre um cenário e um projector. entre uma voz e um suspiro breve.

palmas, queríamos palmas e as palmas tivemos. por elas, obrigado. por nós, as palmas vai continuar a dançar nos esconderijos deste teatro. sempre com emoção.

sexta-feira, outubro 28, 2005

escada


estava ali. tinha atrás de si mais de duas centena de degraus e à sua frente pouco mais de meia centena. estava, por assim dizer, numa posição confortável. naquele patamar almofadado, os ecrãs LCD transmitiam-lhe memórias vividas desde o início da subida: a determinação, os obstáculos, as raivas, os nervos, as angústias, os sorrisos, as palmas, as palavras, os panos que se abriram e fecharam, semana após semana, defronte às plateias.

uma subida gloriosa, dirão alguns. podia continuar a subida, vir a descobrir o que fica para lá do último degrau – o “degrau dourado” –, saber na pele o sonho de tantos.

naquele momento, tomou uma decisão: iria voltar a descer. “Estás louco?”, perguntaram-lhe os companheiros da viagem. “Estarei? Lá em baixo posso, de novo, voltar a sonhar com a subida. Daqui para a frente é sempre igual.”

na verdade, o que ele tinha era medo de estar por cima das nuvens; ele que tanto gostava de chuva.

terça-feira, outubro 25, 2005

a conspiração

depois d'"O Código Da Vinci" e de "Anjos e Demónios" o génio de Dan Brown está de regresso. "Conspiração" é título do novo livro que junta "um meteorito, a NASA, o Ártico, e o presidente dos EUA".

pelo que me toca, depois do embalo que foi o "Código" e o fascínio que me provocou "Anjos e Demónios" [que considero genialmente bem escrito], já dei mais um pequeno arrombo no orçamento para trazer esta "conspiração" para a biblioteca cá de casa.

para já, quem em nada se pode queixar é a Bertrand Editora que descobriu em Dan Brown a sua galinha dos ovos de ouro numa relação que, segundo se consta, está para durar.

quanto a mim, vamos ver quanto tempo resisto à tentação daquelas páginas... e se a elevada expectativa encontra reflexo na realidade.

segunda-feira, outubro 24, 2005

o estado da nação e a máquina do tempo

cheguei a uma triste conclusão: o país está mesmo a andar para trás [dirão alguns: mais vale tarde do que nunca].
mas, atentando bem, a frase para além de verdadeira num sentido metafórico, não deixa de perder significado mesmo quando levada à letra. reparem: estamos a andar tão para trás que até os políticos de há dez anos estão todos, de novo, na ribalta.

alguém se importa de pôr a máquina do tempo a trabalhar ao contrário?

e, assim sendo, não sei se me penitencio ainda mais ou se me levanto e rio.

levanta-te e ri

o popular programa de humor da sic está, esta noite e pela terceira vez, de volta ao grande auditório do cae. tinha tudo para lá estar hoje, outra vez na primeira fila. afinal, rir ainda é um bom remédio e, de facto, os programas ao vivo são bem mais interessantes do que na televisão.
mas, confesso-vos, hoje não me apetece e, assim sendo, não vou e ponto final

penitência

a nossa vida nem sempre é aquilo que queremos, mas é com ela, com tudo o que tem de bom e de mau, que temos de viver todos os dias.

sou pois acusado, legitimamente diga-se, por alguns de não me dedicar o suficiente a este palco, de não actualizar com a frequência que se exige as palavras neste teatro e, sendo esta a mais pura e cristalina das verdades, assumo a totalidade da culpa.

o processo e a sentença obrigam-me agora a reflexão séria e a atitude firme. veremos do que sou capaz.

um ano à beira-mar

tudo passa veloz. os locais, as pessoas, as emoções, cada manhã e cada fim de tarde, conjugações de verbos num tempo sempre passado e já vivido. e ficam para nós, em cada um de nós, as memórias na alma e na pele [como cantaria a Mafalda].

a vela que
à beira-mar se levantou conta já com história, construída nas idiossincracias de tantos e tantos marinheiros, em tantas e tantas ondas, numa viagem sempre atenta, verdadeira e pessoal.

a praxe obriga-me a dar os parabéns ao zé luís e, num momento seguinte, o desejo de felicidades no seu novo trabalho, lá
do alto do castelo. são frases feitas, pois são: o verdadeiro significado delas mora no olhar, no abraço amigo.

o teatro, por seu turno, agradece-lhe as palmas (e as palmadas). e pede-lhe que continue, porque, como já se disse, tudo passa, mas nada deixa de ficar gravado seja lá onde for.

segunda-feira, outubro 17, 2005

gotas de sal

quantas mais vezes tentava esboçar um sorriso, mais o teu olhar se confundia com o mar. e nesses instantes entre a realidade e o sonho, quando sei estar perto do fim o céu, nunca conseguirei tirar do dicionário [ou da alma] palavras que cheguem [ou que falem somente].

impotente. o teu sofrimento alimenta a minha inadaptação à dor, aos teus olhos manchados de angústia, ao teu rosto coberto de sal. não fosse a chuva miudinha que, por agora, me lembra o sangue quente que ainda corre e, neste momento, seria uma bola de fogo, de raiva, quem sabe o furacão agreste que [felizmente] nunca senti, rumo à explosão final: um rebentamento de mim.

e por favor – eu sei que consegues – não me fales do sol que vai voltar a nascer. mostra-me antes o brilho dos teus olhos por entre as gotas que te vincam a face. e deixa-me sentir nos teus lábios o sabor da vida, a certeza de que, juntos, duas cerejas inseparáveis, beberemos, já esta noite, essas lágrimas como um cocktail doce, suave e sem álcool.

foto: ["ashes everywhere", sweetcharade, 9.10.05]