sexta-feira, dezembro 31, 2004

esta é uma noite para comemorar

esta é só uma noite para partilhar
qualquer coisa que ainda podemos guardar cá dentro
um lugar a salvo para onde correr
quando nada bate certo
e se fica a céu aberto
sem saber o que fazer
esta é uma noite pra comemorar
qualquer coisa que ainda podemos salvar do tempo
um lugar pra nós onde demorar
quando nada faz sentido
e se fica mais perdido
e se anseia pelo abraço de um amigo
esta é uma noite para me vingar
do que a vida foi fazendo sem nos avisar
foi-se acumulando em fotografias
em distâncias e saudade
numa dor que nunca cabe
e faz transbordar os dias
esta é uma noite para me lembrar
que há qualquer coisa infinita
como o firmamento
um sorriso, um abraço
que transcende o tempo
e ter medo como dantes
de acordar a meio da noite
a precisar de um regaço
Mafalda Veiga, in Tatuagens
um espectáculo de 2005!

na hora do balanço

apanhado de surpresa pela fúria dos acontecimentos, acabei engolido pelo tempo. quando dei por mim já lá ia uma semana inteirinha sem plateia, sem teatro, sem palavras. apenas a vida. nua e dura. o trabalho, as reuniões, as iniciativas, os preparativos para tudo e para nada, a busca de sonhos, a realização de outros, horas, minutos, segundos tão fugazes como a vida. e hoje, qual peça trágico-cómica, dizem-me que acabou mais um ano. e assim é.
não gosto de balanços, principalmente quando o passivo assume maior significado do que o activo e os capitais próprios são escassos. nas empresas como na vida ter um balanço destes não é nada, nada bom. contudo, felizmente (à que dar as graças a quem as merece!), o balanço dos meus últimos 366 dias não sofre daquele mal.
profissionalmente, separemos duas fases. o primeiro semestre foi para esquecer. a angústia da incerteza, o diz que disse crónico, a falta de solidariedade e companheirismo, a ruptura da equipa... e estou eu de férias no Luxemburgo e na minha caixa do correio cai a minha carta de cessação de contrato. férias estragadas? quase. felizmente, após o regresso, e lá entramos no segundo semestre, as coisas tomam outro rumo. uma nova administração assume funções, a equipa sofre reajustamentos e (à que dar graças a quem as merece) lá continuei, a bem da verdade, nada pior do que antes. há que admiti-lo: muito bem mesmo!
pessoalmente, as coisas dividem-se também em duas fases temporais. curiosamente, igualmente no primeiro e no segundo semestre. no primeiro, os momentos de prazer, a suavidade da tua pele, o olhar o mar a teu lado, o saber-te ali sempre que precisava, fizeram desses loucos momentos suaves recordações. depois as coisas tinham que ser definidas e tu acabaste longe. depois disso apenas a beleza de um rosto, o carinho de outras palavras, e a verdade é que, acredito eu, por acordares todos os dias à distância de quilómetros, cá estou sozinho. triste? quase.
os amigos são a compensação de tudo. permanecem os mesmos. iguais a si próprios. loucos, determinados, carinhosos, amigos e pronto. a vocês, aos que estão longe e aos que estão perto, dedico o meu ano. obrigado por tudo.
e o balanço resume-se assim: o activo engloba a profissão, a realização pessoal e a concretização de alguns sonhos e o passivo acumula as despesas com o campo emocional. os capitais próprios assumem no meu balanço o enorme peso da amizade. e essa (à que dar graças a quem as merece!) dá-me equilíbrio para viver feliz. em consciência, de bem com os outros e com o mundo.
venham mais 365 dias. mais palavras, mais cenários, mais teatro, mais plateias. cá estou eu para os viver.

sexta-feira, dezembro 24, 2004

porque hoje é natal...

... as palavras não podiam ser mais simples.
a blogosfera já faz parte da minha família. por isso esta noite, junto dos que mais amo, beberei um copo (ou mais!) a pensar em todos vocês!
e como não poderia deixar de ser...
um feliz e santo natal para todos.

quarta-feira, dezembro 22, 2004

êxtase

depois de ler um post da Ana
Ontem,
na plenitude apocalíptica do ser,
nas ondas do teu cabelo,
suave, doce, misterioso, maresia
compreendi-me uma vez
o cheiro a lua, o azulado do céu
tu e eu transformados em nós
juntos na areia fria e de ninguém
por momentos soltas as nossas mãos
nas delícias de um vulcão
no desejo imperioso do tempo
com o mar a teus pés, suspirando
os barcos discretos, as estrelas
a multidão e tu e eu
loucos, no teu corpo meu
em tudo o que era nosso
até o tempo, até o mar, até o som
a noite do sol e sem vento
na verdade inesquecível do instante
e lá longe a vida, o mundo
ontem será sempre hoje
doce lembrança no futuro
a benção da natureza
13/06/2001

segunda-feira, dezembro 20, 2004

amizade a quanto obrigas

o telemóvel toca.
olha hoje não vai dar. preciso de descansar. sim, eu sei. pois, está bem. hoje tive um dia complicado. jovem, eu não tenho a tua vida! sim, sair com os amigos ajuda a relxar, eu sei... pronto, está bem. convenceste-me.
às 21h30 no sítio do costume.
e em dois minutos sou obrigado a reabrir a conta corrente de hoje.
felizmente, a guia de remessa não obriga a pagamento e a encomenda fica-se por umas boas gargalhadas.
os amigos são mesmo assim. estão lá... sempre.

conta corrente

venho para casa perdido na confusão dos números, das contas, dos euros, dos cheques e das facturas... no fim do dia, o sol já foi, já desliguei o computador e o silêncio toma conta do espaço. ouço pela primeira vez em largas dezenas de minutos a minha própria respiração. lenta, sincronizada, cansada. já lá vai mais um dia. mais um. a seguir vem o volante, a estrada, os faróis que nos encandeiam em cada esquina, os semáforos - sempre vermelhos! -, um gato perdido na passadeira para peões e a nossa casa... tão minha. não estás lá para me receber com um sorriso. não estás lá para me receber zangada. simplesmente não estás. e as contas, os números e tudo o resto dá lugar à solidão. sem sorrisos, sem palavras, sem gestos. tenho esperança no sonho que há-de chegar. tenho esperança no dia de amanhã. tenho esperança noutros sorrisos. quanto mais não sejam aqueles roubados à felicidade de um cheque contra recibo. até lá... boa noite. por hoje a minha conta corrente está saldada.

domingo, dezembro 19, 2004

algodão doce

adoro lençóis de estrelas. quentinhos. e o som das ondas e dos teus sussuros ao meu ouvido. do que falas nem eu sei. sei apenas que estás ali e que é bom estares aqui. é bom demais ter-te ao meu lado. recebo os teus doces beijos como açúcar. sinto a tua pele na minha, macia como o algodão. tento conciliar a minha respiração à tua. é doce a tua brisa. é suave o teu cheiro. é tão bom estar ali. aqui. gostava de cristalizar esta sensação. cristalizar o momento. para que por ele pudesse viver todas as outras horas e minutos e segundos de cada dia. algodão doce. açucar cristalizado. açúcar que se pega às mãos e que custa a largar. vejo nos teus olhos amor. e, por momentos, quero fazer parar o mundo. reduzi-lo ao nosso espaço. mas as estrelas também se vão embora e com elas se desfazem os lençóis. a vida está aí novamente. pelo menos, por esta noite, estiveste aqui. e na minha boca sempre deixaste o teu sabor. era de algodão doce.

quinta-feira, dezembro 16, 2004

no intervalo do tempo

entre o chegar e o partir novamente não podia deixar de vir aqui deixar um sorriso.
afinal, mais vale um sorriso nos lábios que um murro nos dentes!
e boa noite.

quarta-feira, dezembro 15, 2004

blasfémia

quatro cadeiras, uma mesa. ao fundo, o balcão envidraçado, as garrafas coloridas, os chocolates. sente-se no ar a disposição leve dos dias bem vividos, as gargalhadas sentidas, as anedotas geniais, as porcas, as malucas, as ‘tecla três’, as louras, as alentejanas. os turistas e as gentes da terra por ali ficam. de sorriso largo e coração aberto. sabem bem aqueles fins de tarde! e esta? qual? esta: um padre da província contava na Eucaristia um dos mais famosos milagres de Cristo, aquando da sua visita à Terra: a ressurreição de Lázaro. “E então Cristo pegou nas mãos de Lajaro e dixe-lhe: ‘Lajaro, alebanta-te e anda’ ... Lajaro alebantou-xe e andeu". Nisto, ouve-se uma voz do fundo da Igreja: ‘Andou, estúpido!’ Ao que o padre respondeu: ‘Pois andou estúpido durante uns tempos, mas depois paxou’”. num ápice, o sossego do sol ao retirar-se dá lugar à confusão: a polícia! eis que de metralhadora na mão, duas dezenas de polícias enroupem pelo bar dentro, ordenando: “Mãos ao ar! Estão todos presos por blasfémia!” o quê? por blasfémia? vê-se então levantar-se de uma das quatro cadeiras iniciais António, um velho pescador, que do alto dos seus cabelos brancos, enche o peito de ar e questiona: “Então que é feito da liberdade de expressão?” o rosto do oficial presente transfigura-se e, num berro, sentencia: “Quem? Liberdade de expressão? Mas eu quero lá saber da sua mulher para alguma coisa! Choldra, já!”
"Se não forem cuidadosamente delineadas, podem ser assaz perigosas as propostas oficiais de revivescência e ampliação do crime de blasfémia em alguns países europeus (Holanda, Reino Unido)" in Causa Nossa.

segunda-feira, dezembro 13, 2004

mãos

mãos. as tuas mãos que vagueiam perdidas sobre a areia. mãos que procuram o corpo, a certeza, o calor, o coração que as largou ao vento. sentem o mar por baixo delas, lá no fundo, a imensidão de tudo por baixo do manto arenoso, por baixo de milhares de grãos de areia, por baixo das tuas lágrimas. mãos. as tuas mãos que procuram as ondas que fogem, que vêm e tornam a fugir. como todo o mundo, como o teu corpo e o meu corpo que se entrega e se recolhe, se dá e se esconde. as tuas mãos apoiadas na solidez da incerteza. as tuas mãos no nada. as tuas mãos vazias de alma. as tuas mãos no fogo da paixão esquecidas de amar. as tuas mãos sozinhas, enraivecidas, cruéis, parciais. as tuas mãos juízas da vida. as tuas mãos que sentenciam o rumo da areia, dos grãos que te escorrem pelos dedos e se deixam levar pelo vento. as tuas mãos ali, esquecidas, sem anéis, sem alianças. sozinhas. mãos. longe de ti, longe de mim.

domingo, dezembro 12, 2004

momentos

há momentos, pequenos, nas horas
que nos transportam para lá de nós
levam-nos para junto da nossa voz
onde o sonho se enche de histórias

lá onde o sorriso se põe como o sol
onde a lua brilha e luz na penumbra
entre desejos perdidos na bruma
que se escondem da luz do farol

há momentos, grandes, nos minutos
que nos fazem homens com vida
escuta-nos a alma no tempo perdida
onde a chuva cai e brincam os putos

lá onde a idade não mora, mas vive
não chora, mas ri e dança sempre
onde se vê flores feitas de gente
e se canta com amor o vento livre

28/02/2002

...

"se não lutarmos pelo futuro que queremos, o mais certo é termos o futuro que não queremos"
das frases que me acompanham desde sempre.
e aqui o sempre é um dia em que li a "fórum estudante", já lá vão uns anos valentes, e o secretário de estado do ensino secundário da altura, cujo nome façam o favor de não me perguntar, disse esta frase, incentivando os alunos à defesa dos seus interesses. era preciso não desistir. não baixar os braços. era preciso lutar sempre. por nós e pelos outros.
acreditem ou não, apaixonei-me pela frase e ainda hoje, em surdina ou bem alto, a faço discursar para mim. tantas e tantas vezes.

no meio do palco

abre-se a cortina no pequeno teatro
no meio do palco, sozinha
acaricia as sapatilhas
no meio do palco, sozinha
um silênciono meio do palco, sozinha
olhares perdidos na galeria
no meio do palco, sozinha
acaricia o corpo lânguido
no meio do palco, sozinha
medo de tudo, menos de dançar
no meio do palco, sozinha
vestidinho justo, postura firme
no meio do palco, sozinha
cabelo vermelho levemente quente
no meio do palco, sozinha
pés no assoalho, um pulo
no meio do palco, sozinha
todas as músicas
no meio do palco, sozinha
duas piruetas
no meio do palco, sozinha
escuro na coxia
no meio do palco, sozinha
outro pulo bem alto e um rodopio
no meio do palco, sozinha
orquestra fantasma
no meio do palco, sozinha
anos de estudos
no meio do palco, sozinha
um diário de verdades
no meio do palco, sozinha
lembranças de dias bons
no meio do palco, sozinha
tempo solicitado
no meio do palco, sozinha
horas em cima de dedos
no meio do palco, sozinha
beijo de brisa
no meio do palco, sozinha
um vai, uma volta
eu, na platéia
você, no meio do palco
quem disse que estamos sozinhos?
SP 11/10/01 Jean Boëchat

sábado, dezembro 11, 2004

vocação

vocação para mim é o talento ao serviço de um fim.
o talento que encontro na mãos de uma médica muito jovem, que para lá da sua competência técnico-profissional, em fase de consolidação é certo, transporta consigo o amor pelo que faz, aliado a uma intensidade humana fortíssima. com ela, aprendi que os médicos também têm nervos, também suam, também têm medo e também nos pedem para rezar. por eles e por nós.
o talento que encontro nas mãos de um cirurgião-chefe, do alto da sua autoridade científica, afastado dos medos, dos nervos, dos receios, das rezas e que se dá ao trabalho com conhecimento de causa e ponto final. no final, depois da obra feita, sorri e também sabe contar histórias.
o talento que redescubro no brilho dos olhos de uma assistente social que sofre com o paciente, que ri com o doente, que chora com a vida. com ela aprendi o verbo entrega. aos outros, a nós próprios, à vida pelo prazer da vida.
com todos eles aprendi o que é vocação. com todos eles, aprendi a acreditar num país melhor. aprendi que é possível, mesmo dentro do sistema nacional de saúde, haver funcionários públicos competentes. ao serviço de todos.

cuidado: frágil!

depois desta minha última semana, e ainda em fase de recuperação, houve conceitos estruturais que se alteraram definitivamente na minha forma de ser. e o que é que eu quero dizer com esta frase sacada à moda do Dr. Sampaio? que para mim todos nós, homens e mulheres, devíamos trazer escrito, em local bem visível (a testa parece-me bem), a frase: cuidado: frágil! porque é disso que se trata efectivamente a vida humana: algo de muito frágil. podemos estar bem, sentirmo-nos os melhores do mundo e, de repente, sem quê nem para quê, aí estamos nós diminuidos fisica ou psicologicamente, porque o corpo ou a alma, este sistema complexo, nos resolve pregar uma partida. nestes dias, sublinho a importância da saúde na nossa vida. reconheço a efemeridade da vida humana.
todavia, sei que pelos condicionalismos da vida prática, lá virá o tempo em que estes considerandos não terão valor nenhum. farão apenas parte de um momento, daquele momento passado. contudo, é hoje, neste momento, que os sinto e que, por isso, os devo sublinhar. porque são reais e devemos aproveitarmo-nos da lucidez quando ela nos visita.
e deste discurso, retiro para o meu interior, que a vida é frágil. que os sorrisos são importantes é no presente, porque se o futuro têm importância ele, em si, é incerto.
por isso, meus amigos, há que viver a felicidade hoje.
afinal, um sorriso não custa assim tanto. e amanhã pode já ser tarde demais.

sala de (des)espera

e é assim: de um momento para o outro, eis-nos perante situações completamente novas. ali estava eu, após uma semana de dores intensas na zona umbilical e uma passagem pela médica de família, na sala de espera do hospital. a triagem foi rápida, deram-me uma cor qualquer (ainda hoje estou para descobrir qual), e mandaram-me esperar. "naquela sala ali. sente-se e espere". a sala estava vazia. eu, a televisão e as paredes nuas. brancas e amarelas. que seca! bem que podiam dar um pouco mais de alegria à sala, mas enfim... é o serviço de saúde que temos. e lá estava ela, em lugar de destaque na parede central, a placa informativa: sala de espera. e eu continuei à espera. dezenas de minutos depois a sala já estava cheia. as dores continuavam, as cenas da política à portuguesa repetiam-se na televisão e eu continuo à espera. alguns minutos depois, revejo a placa informativa com mais pormenor: sala de desespera. o quê? não é que alguém tive a feliz ideia de acrescentar à placa, em local estratégico diga-se a bem da verdade, três letras, escritas a preto e à mão, e que tornaram a sala de espera em sala de desespera. como eu compreendo essas abençoadas mãos! e de repente, ouve-se no altifalante, para que todo o hospital fique a saber: "ricardo, gabinete de cirurgia". gabinete de cirurgia!? ok, eu tenho calma, levanto-me e lá vou eu...

segunda-feira, dezembro 06, 2004

ao final do dia...

as estrelas estavam lá, dispersas no azul escuro da noite. a areia primeiro, um extenso areal fez-me companhia, acompanhando-me os passos ao longo da avenida. está bonita, a nossa avenida, após a queda de algumas estrelas que, imaginem só, ficaram penduradas nos ramos despidos das árvores. mais longe, já depois de muitos passos e passos, perna para lá, perna para cá, ouvi os sinos da Igreja tocarem. uma melodia doce, recortada pelos compassos das ondas. que combinação original, vejam só: ondas e sinos. mas a nossa Figueira é assim mesmo.
levei por companhia a solidão. uma excelente companhia, digo-vos já. pelo menos, está sempre disposta a ouvir os nossos desabafos e raramente discorda de nós, salvo uma ou outra vez em que a consciência se mete ao barulho. e ela acompanha-me, indiferente, inspirando, expirando, ao ritmo das ondas que vão e vêm. o mar está tão masinho. e a noite está fria, mas aconchegante.
há outras almas perdidas na avenida. às vezes, gostava de te ter por companhia. poder falar contigo. e chegar a casa, de mãos dadas contigo, com a penca do nariz gelada, mas a alma bem quentinha.
mesmo assim, sem a tua presença, gosto dos meus passeios. da minha avenida. dos meus passos, noite fora, vigiado pelas ondas, sonhando contigo.

domingo, dezembro 05, 2004

no quente do frio

gosto de Dezembro. do frio lá fora, da lareira que arde cá dentro, dos parágrafos do livro que vou lendo deitado no chão da sala. do silêncio do frio. do silêncio das palavras escritas. gosto também de pensar em ti. imaginar o que fazes nesta noite fria. imaginar o que poderíamos fazer juntos. lembras-te? porque é que o prazer teima em ser como a madeira que arde para me aquecer? porque é que durou tão pouco? arrependido? talvez.
fecho os olhos e dou comigo, de novo, abraçado a ti. lá fora está frio. e cá dentro ferve-me o sangue na certeza da tua presença. e sonho. até que um novo dia chegue. longe de ti, mas consciente dessa verdade.

quinta-feira, dezembro 02, 2004

palavras da época

tal como a fruta tem época também as palavras a têm. noite feliz, noite feliz. palavras adormecidas, escondidas no pó dos dicionários, dos livros, surgem novas, cheias de sentido, com carácter e determinação. é como se nascessem agora, nesta hora, nesta época. tal como as castanhas no outono, os pêssegos, os morangos, as ameixas e as romãs no verão. é natal, é natal. solidariedade, família, sem-abrigo, entreajuda, carinho, amizade são palavras da época. só nesta altura são proferidas e lembradas. é como se durante todo o resto do ano não existissem. vivem no esquecimento. infelizmente, para todos nós, ainda ninguém se atreveu a dar-lhes o destino das laranjas, das maçãs e das bananas. é que esses frutos existem todo o ano. são como o natal: quando um homem quiser. mas enquanto assim não for, e porque estamos na época delas, bebamos dessas palavras o seu néctar. afinal, mais vale agora que nunca. e um feliz natal para todos.

quarta-feira, dezembro 01, 2004

o (re)nascimento de um palco

eu gosto do verbo nascer. vir ao mundo; começar a ter vida no exterior, diz-se no dicionário. dar de si aos outros. apresentar-se. para um actor, para o teatro, ver o nascimento de mais um palco é ver surgir uma incubadora de vida. uma estufa de atitudes, sentimentos, gestos e olhares. ali a vida faz-se de muitas vidas. o suor é dado com amor, com entrega, com paixão. as vidas irrompem-nos o corpo e a alma, tomam conta de nós e dão-se aos outros. por isso o verbo nascer é para mim sinónimo do verbo dar. foi pois com emoção que vi o (re)nascer do palco do Grupo Caras Direitas, em Buarcos. novinho em folha, com tudo aquilo a que tem direito, com todas as condições de vida, para quem nele quiser viver. basta agora, para dar razão à minha emoção (e ao dinheiro gasto), que nele se construa um projecto de vida, como a associação, os sócios, os figueirenses e o teatro em geral tanto desejam e merecem. sim, porque uma vida quer-se vivida. com prazer e humildade.

sem palavras

porque é feriado. porque me apetece. porque sim.